quarta-feira, março 09, 2011

Extinção das 4 Freguesias da Cidade da Covilhã

A PROPÓSITO DA EXTINÇÃO DE FREGUESIAS NA CIDADE DA COVILHÃ
Foi notícia na imprensa regional a intenção da Câmara da Covilhã extinguir as 4 freguesias existentes na cidade constituindo uma só freguesia. No exercício do meu direito e dever de participação quero aqui registar a minha opinião sobre aquela decisão.
A reorganização administrativa da nossa cidade, do nosso Concelho e da nossa região terá que ter por base a vontade expressa das populações.
Não se criam nem se extinguem freguesias sem audição prévia das populações, sem existir uma vontade forte e manifesta das populações em decidir do seu futuro e de se envolverem na resolução dos seus problemas específicos.
No nosso Concelho, após o 25 de Abril de 1974, foram criadas as freguesias da Coutada, Vales do Rio, Sobral de S. Miguel, Cantar Galo e Canhoso e tantas outras pelo País. Todas elas a partir de freguesias existentes.
Foi o tempo da participação mais activa das populações, do exercício da cidadania e da proximidade com o poder de decisão.
O regime democrático aprofundou -se com o aumento da participação dos cidadãos e com a proximidade dos eleitos dos eleitores.
Passados quase 37 anos do 25 de Abril de 1974 vem a Câmara Municipal com os votos do PSD e PS decidir promover a extinção das quatro freguesias da cidade e enviar o processo para a Assembleia da República.
Decidiu unilateralmente sem ouvir os órgãos, nomeadamente as Assembleias de Freguesia, das autarquias envolvidas.
Sem ouvir as populações
Esta decisão a ter efeitos práticos conduziria à constituição de uma mega freguesia com mais de 15 mil eleitores perdendo-se a proximidade dos eleitos com os eleitores, a matriz de cada freguesia e a sua especificidade face à população que em cada uma reside.
A constituir-se uma só freguesia iríamos passar de 60 eleitos para cerca de 20 reduzindo-se, desta forma, a participação dos cidadãos na vida da sua cidade e a possibilidade de sensibilidades politicas de menor expressão elegerem representantes para a autarquia, caso das listas promovidas por cidadãos eleitores.
Esta é a forma que o PSD e o PS encontram para afastarem, na cidade, a representatividade dos restantes partidos e das listas de cidadãos eleitores dos órgãos autárquicos.
O problema das freguesias da cidade não passa pelo excesso de participação nem de representatividade. Nem sequer pela duplicação de recursos e de meios no seu funcionamento, pois, já hoje existe uma partilha dos mesmos.
Poderá existir alguma necessidade de reorganização do território e de planeamento da cidade com o envolvimento activo dos eleitos das freguesias.
Aquela posição da Câmara Municipal, do PSD e do PS, demonstra um perfeito alinhamento, não com as freguesias e as populações, mas com os objectivos do Governo, tanto no que toca à oportunidade política como ao conteúdo (a reorganização administrativa, as novas regras de financiamento das autarquias, a atribuição de novas responsabilidades e a revisão do sistema eleitoral).
A extinção de freguesias e de municípios, como se vai ouvindo é um atentado à vida e representação democráticas.
A crise e o déficit em lugar de conduzirem ao alargamento dos recursos postos à disposição dos chamados governos de proximidade, reconhecidos como sendo aqueles em que, pesem embora erros e distorções, os dinheiros públicos melhor são aplicados e mais rendem económica e socialmente, são pretexto para reduzir os meios, aumentar responsabilidades, extinguir entes públicos e diminuir a representatividade dos seus órgãos, a participação dos cidadãos nas decisões que lhes respeitam e a qualidade da democracia.
A reorganização administrativa que se impõe passa pelo que tem sido o sentido da intervenção nos últimos 37 anos, a saber, o da criação (cautelosa) de municípios e de freguesias, aproximando cada vez mais a administração dos cidadãos, alargando a reprodutividade dos pequenos investimentos imprescindíveis ao bem-estar e à dinamização dos tecidos económicos das comunidades e prevenindo a desagregação social.
Mas passa também por fazer diferente do que se tem feito no que toca ao respeito pelas normas constitucionais aplicáveis: distribuir com justiça os recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias locais; descentralizar, alargando as atribuições destas com o reforço dos meios necessários; respeitar a sua autonomia; instituir as Regiões Administrativas.
Com medidas justas e o poder administrativo regional democraticamente constituído é possível reduzir bem mais a despesa pública do que através da extinção de um largo número de freguesias.

Contra a crise é necessário mais democracia, mais e maior participação dos cidadãos, maior proximidade e transparência da administração e não menos pessoas públicas, menos órgãos eleitos, menos cidadãos a decidir sobre a coisa pública, mais distância entre administradores e administrados, mais secretismo nas decisões.
A colegialidade dos órgãos do poder local e a pluralidade na sua constituição são essenciais à transparência na gestão e à confiança dos cidadãos na democracia. São de crocodilo as lágrimas e de fariseu os apelos daqueles que, permanentemente, gritam pela democracia e pela participação democrática e não perdem uma oportunidade para lhe diminuir a amplitude, reduzir o número de cidadãos eleitos, concentrar poderes no menor número possível, tornar opaco e distante o seu funcionamento.
Mais do que uma séria preocupação sobre a organização administrativa do país – que a existir conduziria desde logo à indispensável criação de Regiões Administrativas – o que se visa com o projecto de “racionalizar” é extinguir freguesias e concelhos, uma extinção, que a pretexto da crise e do défice, tem por objectivo empobrecer a expressão democrática da organização política, reduzir a participação e representação democráticas, eliminar expressões de proximidade e intervenção populares nos processos de decisão e controlo da vida política local.
É a qualidade da democracia e também a qualidade de vida das comunidades locais que são os alvos directos deste objectivo.
Medidas e objectivos inseparáveis de outros como os de alteração às leis eleitorais ou o da ofensiva em curso contra a autonomia financeira e administrativa do poder local.
A “reforma” pretendida por PS e PSD traduzir-se-ia, a ser aprovada, em prejuízos para as populações; em mais abandono, em menos atenção e investimento local indispensáveis à vida económica e social dos territórios abrangidos; em enfraquecimento da defesa de interesses da população e de representação dos seus direitos; em menos participação democrática.

Vitor Manuel Reis Silva, eleito do PCP na Assembleia Municipal da Covilhã

Um comentário:

Anônimo disse...

Como é óbvio, e ao contrário do que é aqui referido, o processo de extinção de freguesias passa sempre pela audição dos órgãos autárquicos atingidos, nos termos da legislação em vigor, pelo que as iniciativas realizadas na Covilhã, assim como noutros municípios do país, constituem apenas uma fase muito preliminar de um processo que até poderá não ir avante. Além disso, não é verdade que a extinção de freguesias seja sempre má, já que, e utilizando as palavras do autor, houve muitas situações de criação pouco cautelosa de freguesias. Mais: muitas das actuais freguesias, especialmente no norte do país e nas zonas rurais, correspondem à antiga organização eclesiástica, logo, já não estão adaptadas à actual realidade demográfica. Note-se, a título de exemplo, que na zona baixa de Lisboa, o Patriarcado de Lisboa já se tinha adiantado, tendo realizado a reorganização das suas paróquias há já mais de 10 anos. Portanto, parece-me que neste aspecto em particular, e ao contrário do defendido pelo tão apregoado e pouco cauteloso laicismo, é o Estado Português que tem de se "laicizar" de forma inteligente, adoptando em tempo útil (já vai atrasado) as iniciativas que se revelarem necessárias à sua reorganização e modernização administrativa, face à nova realidade. Resumindo, e embora custe admitir isso, o PCP e os outros partidos, que não o PS e o PSD, estão preocuapdos com a sua consequente subrepresentação junto nos órgãos autárquicos, já que estão condenados a não terem vocação de poder governativo. Mas quanto a isso, só podem culpar o mesmo povo com cuja representação estão muito preocupados se forem extintas freguesias. O mesmo povo, que segundo a nossa constituição, é soberano.